domingo, 5 de julho de 2009

SECÇÃO RELATIVA AO CONCEITO DE MUDANÇA


Mudam-se os tempos, Mudam-se as vontades

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem – se algum houve – as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
e enfim converte em choro o doce canto.

E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
que não se muda já como soía.


Evolução na sociedade

Neste poema de Luís de Camões podemos observar que é repetida um sem número de vezes a palavra “mudar”, esta palavra remete-nos para uma mudança constante de valores, uma evolução constante na tecnologia, nos modos de vida, enfim, uma mudança constante na sociedade. Na segunda quadra, esta ideia de constantes alterações é reforçada, a palavra “continuamente” representa aqui um advérbio de tempo que nos indica a frequência destas alterações. Contínuas, constantes, são algumas palavras entre muitas que poderíamos utilizar para caracterizar estas mudanças na sociedade, e no poema esta ideia é repetidamente reforçada, por exemplo no segundo terceto o primeiro verso diz-nos: “E, afora este mudar-se cada dia,...”, que nos remete novamente para uma ideia de continuidade nas mudanças na sociedade e no nosso mundo. Estas mudanças acontecem de uma forma gradual mas que ao longo dos tempos vai transformando completamente os valores morais, os valores culturais, entre outros.
No mundo onde vivemos, estas alterações são bastante perceptíveis e fazem-se sentir no dia-a-dia, outras vão sendo alteradas sem nós muitas vezes nos apercebermos. Se compararmos os valores existentes na sociedade moderna e nos tempos antigos, poderemos encontrar uma grande desigualdade, a rigidez dos costumes que vão sendo cada vez mais substituídos por uma atitude de descontracção, onde o mundo vai oferecendo tudo o que nós precisamos, o conforto, o dinheiro, o poder, etc. Estas regalias fazem com que toda a sociedade se vá transformando ao longo dos tempos numa sociedade de arrogância e menosprezo pelo resto do mundo.
Este mundo em tempos passados era um mundo onde a natureza predominava, a produtividade vinha precisamente desta natureza, mas os costumes e os hábitos mudam e esta sociedade que vou designar de sociedade “natural”, foi substituída por uma sociedade “artificial”, onde a poluição é uma constante, o barulho é frequente, o contacto com as pessoas vai sendo cada vez mais substituído por meios tecnológicos, que simulam uma realização momentânea e o tempo vai passando e fica esta esperança de uma evolução positiva. Esta esperança vai sendo paulatinamente perdida com os avanços tecnológicos, que fazem questão de mostrar peremptoriamente que o mundo que era, já não o é. Esta ideia é bem patente no poema onde o sujeito poético faz questão de demonstrar um sentimento de saudade pelo tempo que passou e foi substituído pelo presente. Mostra também um sentimento de mágoa talvez pelo mundo que outrora era o “seu”, actualmente é um mundo com o qual ele não se identifica.
Na segunda quadra do poema é de salientar duas palavras, que podemos relacionar e interligar, a palavra mudança e a palavra permanência, duas palavras com significados bem diferentes mas que neste poema, e mais especificamente na segunda quadra, possuem uma grande relação. A palavra mudança, que nos leva a imaginar as grandes mudanças na sociedade ao longo dos séculos, as constantes novidades que vão aparecendo, mas esta mudança remete-nos exactamente para o seu inverso, a permanência. Esta permanência está directamente relacionada com as recordações que ficam para sempre, as pessoas que serão sempre lembradas, os tempos que mudaram mas vão permanecer de forma continuada nas mentes de cada um, logo a mudança leva-nos à permanência. Sem mudança não há permanência, que por sua vez se não permanece a saudade é porque certamente não houve mudança.
No primeiro terceto, encontramos citações que o autor utiliza para diferenciar o tempo passado do presente e utiliza expressões como “verde manto” para caracterizar através da natureza aquilo em que se vai tornando o mundo. Um mundo que no passado era constituído por uma “neve fria”, vai sendo coberto por um “verde manto”, este manto no passado era neve e esta neve que, apesar de fria aparentava uma beleza impossível de recriar nos dias de hoje. Assim acontece com a sociedade, vai evoluindo através do tempo e vai transformando a sociedade numa sociedade de interesses económicos, onde cada passo em direcção à evolução significa um passo em direcção ao esquecimento da sociedade onde existia uma bela “neve fria”.
No último verso do segundo terceto, o autor faz alusão aos tempos modernos e aos antigos através de expressões que fazem questão de vincar o sentimento humano em relação a cada um deles. O “choro” consequência do “verde manto”, e dos tempos modernos que originam uma saudade daquilo que o mundo foi e já não é, por sua vez o “doce canto” que existia nos tempos passados, remete-nos para uma felicidade que existia e actualmente é substituída, através de novos meios tecnológicos, por interesses económicos. Estas expressões, caracterizam profundamente qual o sentimento do autor em relação a estes dois tempos distintos, o passado e o moderno
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